O Grande Hotel Budapeste (2014)



Certos cineastas sofrem de uma maldição.
Basta ver um instante de seus filmes pro espectador perceber que vai ver o mesmo filme de novo.
Estão lá os mesmos elementos, desde a fotografia, até a condução narrativa.
Sei que tem a questão do estilo do cara, e tal, mas muitas vezes são só os mesmos recursos pouco inspirados e apoiados na muleta dos efeitos especiais e estilo videoclíptico.
Mas alguns cineastas, por algum motivo, conseguem usar em seu favor a familiaridade do público com suas obras.
Wes Anderson é alguém que nem exige mais que um minuto de filme pra que qualquer pessoa no globo terrestre tenha certeza de que é um filme dele.
É o mesmo universo particular, em que habitam seres humanos (ou não necessariamente, que nem no caso de O Fantástico Senhor Raposo) repletos de idiossincrasias e os mais inusitados cacoetes mesclados em suas personalidades.
No entanto, isso não soa repetitivo ou tedioso.
Talvez porque, apesar de olhando superficialmente parecer a mesma coisa, existe sempre um reinvento.



Quem sabe por isso que um dos pontos altos dos filmes dele sejam o elenco.
E não tô falando de contar com uma dupla de atores de renome em papéis de destaque.
É sempre uma penca de gente conhecida, e reconhecida pelo seu talento que é escalada pra cada novo trabalho do diretor.
Dessa vez não é diferente, óbvio.
Vai anotando: Ralph Fiennes, Bill Murray, Tilda Swinton, Edward Norton, Jason Schwartzman, Tom Wilkinson, Willem Dafoe, Mathieu Amatric, Jeff Goldblum, F. Murray Abraham, Harvey Keitel, Adrien Brody, Saoirse Ronnan, Jude Law, Owen Wilson, Fisher Stevens, e mais algum ou outro que eu lamentavelmente possa ter esquecido.
E além deles, tem um ator que merece ter a honra de estrelar uns filmes massa nos próximos tempos pra se firmar um dos bons atores de um futuro que há de vir, e ele atende pelo nome Tony Revolori. Atuando sem se acovardar diante desses figuras todos mencionados acima, ele interpreta um dos personagens mais importantes da trama, e tem a seu dispor vários dos momentos antológicos propiciados pelo roteiro.
As atuações nos filmes de Wes Anderson também seguem uma linha bem reconhecível, e dessa vez não foi diferente, com os atores driblando a caricatura pra compor novamente excentricidade fazendo uso dos trejeitos quase cartunescos de seus personagens.



A trama, enquanto isso, flerta com o absurdo, e em sua narrativa ágil, e de elementos nonsense, consegue falar de dilemas humanos sem parecer piegas ou pretensioso.

É ao seu modo escapista, e ao mesmo tempo algo profundo no enredo que correlaciona o humor que qualquer um espera de Wes Anderson, com um clima de história de espionagem aos moldes de alguns clássicos, sejam do cinema ou dos quadrinhos.
Na história, o metódico concierge do Grande Hotel Budapeste, Gustave (Ralph Fiennes), se vê às voltas com as consequências, reviravoltas, e conspirações decorrentes da morte de um dos clientes do hotel localizado na fictícia nação Zubrowka.
Tudo isso começa narrado em forma de flashbacks sobrepostos, que invés de tornarem confuso o desenrolar, adicionam camadas e significados a mais pros personagens, de cada ação nesse movimentado roteiro.
Isso desencadeia motivos o bastante pra que se façam presentes uma iminente guerra, um romance inusitado, planos de fuga, corridas na neve, assassinatos, interesses sórdidos, dedos cortados caídos na neve, e um quadro de um guri com uma maçã que as pessoas parecem achar uma obra de arte pela qual valha a pena se incomodar.
Tudo isso torna o ritmo do filme um tanto mais (quem sabe não seja exatamente essa a palavra) mas eu diria de momento... que faz dele um filme um tanto mais histérico. No bom sentido. Se houver.
Existe uma urgência que até gera desconforto quando se iniciam diálogos prolongados, mas não menos divertidos, quando a situação requer uma fuga ou algo assim, e os personagens ficam lá tagarelando sobre assuntos estapafúrdios. Pra nós da plateia, pelo menos. Porque pra eles são coisa importante.
Mas perdidos em suas banalidades de relevância discutível, os habitantes do mundo criado pelo Wes Anderson definem prioridades que pro espectador tornam ainda mais interessante e divertido assistir o longa-metragem.



Além disso, esse é mais um caso em que a direção de arte, direção de fotografia, e o esmero na produção viram um personagem, e que realmente fazem diferença. E eu não tô falando em ter mais dinheiro que o outro pra fazer CG. É arte mesmo, só que sem o status “chato de galocha” que acompanha a maioria das obras que recebem o adjetivo “arte” logo depois das palavras “cinema de”.
E também não dependendo de “o 3D foi bem massa” pra compensar o relaxamento na criação do roteiro.
Aliás, O Grande Hotel Budapeste conta com vários diálogos irrepreensíveis.
Enquanto filme cheio de ação, e correrias, e sequências de perseguição, e vilões cartunescos, e toda sorte de elementos que fazem com que se lembre de uma produção estrelada por algum dos James Bond(s) das antigas, “Budapeste” não deixa de lado as falas que tornam os seus personagens tão exóticos, e que os desenvolvem mesmo em discussões aparentemente ridículas.


Ao mesmo tempo, O Grande Hotel Budapeste parece bem simples.
Não tem necessidade de um monte firulas, e forçosas coincidências pra criar nesse filme de 1h e 40min um épico choralhão. Tem até espaço pra maquetes e stop-motion sem de maneira alguma tentar mascarar o fato de que são realmente miniaturas, e que ao mesmo tempo em que tenta convencer de que naquele universo tudo isso é de algum modo real, nunca busca nos enganar quanto ao fato de que o cinema pode envolver sem o exigido uso do realismo (ou do pseudo).
Por vezes, parece mesmo que assim que se inicia a projeção foi feita a reserva no tal hotel-título, e por azar/sorte a plateia se viu em meio aos transtornos consequentes das ambições e manias dos habitantes do local.
Se não é um filme que vai mudar sua vida, pelo menos garante uma imersão e envolvimento (e entretenimento) que 3D nenhum é capaz de criar sem um bom roteiro.
E roteiro, é algo que com certeza não faz falta nO Grande Hotel Budapeste.


Quanto vale:



Grande Hotel Budapeste. Recomendado para: rir do imponderável.

Grande Hotel Budapeste
(TheGrand Budapest Hotel)
Direção: Wes Anderson
Duração: 100 minutos
Ano de produção: 2014
Gênero: Comédia

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