A Última Transmissão (1998)




Em se tratando do aspecto comercial, foram dois os grandes momentos do cinema de filmagens encontradas, e isso não é novidade pra ninguém, ainda que sirva pra ilustrar esse texto.
Afinal, tanto o fenômeno “A Bruxa de Blair” quanto o franquia sem fim “Atividade Paranormal” desencadearam em outros realizadores de cinema o ímpeto de acumular grana através de alternativas caseiras e espertas (algumas das que viriam, nem tanto).
Pra um subgênero que rendeu na maioria produções trash, com poucos na minha memória melhor produzidos, e com cara de blockbuster (dentre eles “Poder Sem Limites” do hoje infame Josh Trank, e “Cloverfield”, pelo Matt Reeves), esse chamariz das duas produções mencionadas no segundo parágrafo acabou sendo essencial pra sua sobrevida, através de um infinito surgimento de pequenos apanhados de ideias e filmagens caseiras.
Porém, o que muita gente ignora, principalmente quando diz que “A Bruxa de Blair” foi o primeiro filme a apresentar esse recurso, é que antes do trabalho dos diretores Daniel Myrick e Eduardo Sánchez a respeito da tal bruxa, outros cineastas já se arriscavam nessa estética, dentre eles Stefan Avalos, e Lance Weller que trouxeram ao mundo este “A Última Transmissão”.



A Última Transmissão” é formatado pra parecer um típico programa de investigação em forma de documentário, idealizado por um cineasta que foi além do que a polícia apurou do caso do programa “Fato ou Ficção” e seu desfecho trágico em busca de desvendar a lenda do demônio de Jersey.
O mockumentário dedica grande parte de sua duração a relatar o processo investigativo realizado pela polícia e o julgamento que via no único sobrevivente de uma incursão televisiva à floresta, o maior suspeito do assassinato dos outros integrantes da equipe do programa tosqueira “Fato ou Ficção”.
Jim Suerd (James Seward), um cara se declarando possuidor de poderes paranormais, havia sido convidado a participar do programa em declínio pelos dois apresentadores, Steven Avkast (Stefan Avalos), e Locus Wheeler (Lance Weiler), e juntamente com o técnico de som Rein Clackin (Rein Clabbers) se embrenha na mata pra uma sensacionalista transmissão ao vivo que terminou muito mal pra todos os envolvidos, rendendo um escândalo midiático na região, e no qual todas as provas eram editadas de modo a não haver dúvidas da culpa de Suerd.
Esta proposta inicial de cinema desvendando um crime é interessante, e até pela sobriedade e sutileza na condução das entrevistas de pessoas próximas e profissionais que trabalharam no caso, o clima é bem mais de suspense do que de terror.
Não há correrias ou gritos. Existe apenas um desenrolar constante de novas informações, bem ao estilo de programas televisivos dedicados a crimes não solucionados.
Com isso, “A Última Transmissão” firma posição em uma narrativa constantemente incrementada com alguma nova informação que por boa parte do tempo só reafirma o que a opinião pública já pensava a respeito da identidade do assassino.




Porém, é quando uma nova possibilidade passa a ser questionada que a história realmente fica mais envolvente.
Novas pequenas surpresas vão sendo apresentadas, e o destino dos quatro integrantes da equipe ganha contornos mais enigmáticos.
As filmagens empregadas no programa “Fato ou Ficção”, pelo seu caráter de extremo amadorismo colaboram pra veracidade que o filme ousa se atribuir, e juntamente com o elenco encenando situações cotidianas e frases banais, funcionam nessa arte da farsa levada a outro nível.
A direção não emprega grandes adereços pra isso. A entrega de revelações apenas não deixando muito tempo entre uma nova pista e outra que é eficaz, no que não chega a ser um longa-metragem empolgante, mas é eficiente em grande parte, pro que é um relato que não tenta repetir o sensacionalismo da mídia apresentada no filme.
A seriedade com que as evidências são encaradas permite questionamentos pertinentes acerca do papel da mídia, e da própria internet, enquanto ferramenta de comunicação que na época estava longe de ser esse acessório visto como indispensável pra cada aparelho eletrônico existente no planeta.
Porém, apesar de esses fatores minimizarem a falta de momentos de clímax na história, eles não conseguem mascarar a grande queda que é a transição entre o mockumentário e o estilo de filmagem tradicional que além de tirar toda a atmosfera criada até então, é o empregado pra contar a parte mais enfadonha do roteiro, que se rende à necessidade de maiores explicações, e de se parecer com um filme convencional.


O tiro no pé faz com que “A Última Transmissão” termine radicalmente inferior ao que boa parte da metragem foi capaz de explorar através de uma técnica de grande potencial, e que permitiu a esse bando de caras realizar um filme sem grande orçamento, ou efeito especial, mas compensando no uso de ideias mais do que no de cifrões pra narrar uma história.
Se desenrolando de modo morno, ao menos não havia nada de tão ruim no longa-metragem de Stefan Avalos, e Lance Weller até o atrapalhado deslize que não desmerece a sua importância, mas o diminui enquanto tentativa de imersão a um conceito desenvolvido de maneira falha, que reservava um pequeno blockbuster inesperado no ano seguinte.



Quanto vale:



A Última Transmissão. Recomendado para: revisitar um importante experimento do qual muito pouca gente lembra hoje em dia.


A Última Transmissão
(The Last Broadcast)
Direção: Stefan Avalos, e Lance Weller
Duração: 86 minutos
Ano de produção: 1998
Gênero: Suspense/Mockumentário

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